A Rosa vermelha espia
por cima do muro
A
chuva da noite ainda era presente nas pétalas da linda Rosa Vermelha.
As
gotículas refletiam, naquela manhã, o sol tímido que começava a rasgar as
esparsas nuvens escuras que, apressadas, corriam atrás da nuvem maior que
seguia relampejando lá no horizonte.
Como
se fosse a rapariga acostumada a ficar de braços cruzados na janela da frente,
a Rosa Vermelha, espiava a rua por cima do muro, naquela hora com o movimento
dos carros que saiam fumegando das garagens e se preparavam para levar os seus
donos para o trabalho.
Veja
a Rosa Vermelha, não é linda? Parece que ela está montando guarda na frente de
nossa casa. A mulher mais observadora retrucou: parece mais que ela está
espiando a rua.
O
homem acostumado às observações da esposa, abrindo a porta do carro, começou a
pensar:
Se
ela passou a noite toda espiando deve ter visto tudo o que se passou. Se ela
soubesse falar quanto não teria a dizer?
Lembrou-se
dos jovens, que iam e vinham passando defronte ao muro de onde espiava a Rosa
Vermelha.
Será
que ela viu os cigarros de maconha que eles fumavam. Sou capaz de apostar que
ela deve ter tapado o nariz para não sentir aquele cheiro de estrume queimado.
Será que ela viu as caras daqueles, ainda, meninos servindo de moldura para os
olhos vermelhos, arregalados, mas sem nada verem. Será que ela viu, por dentro
da cabeça daqueles homens de amanhã, o vazio de ideais e de moralidade. Será
que ela viu ou percebeu as energias negativas da omissão dos pais, dos vizinhos
e do próprio bairro, acompanhando, como uma nuvem negra aqueles mocinhos. Será
que ela viu a preocupação dos anjos de guarda, rechaçados, esperando que alguma
luz se fizesse dentro daquelas carnes que começavam a apodrecerem, para poderem
agir. Será que ela viu ou pensou na falta de vontade política para pôr fim
àquela vergonha. Será que ela viu os homens encarregados de combater o tráfico
daquela morte lenta olharem... olharem... e não enxergarem o que todas as
outras pessoas enxergam
Em
direção ao trabalho, ouvindo a música suave no rádio do carro, continuou a
pensar:
Engraçado
a Rosa Vermelha ontem não estava lá e hoje vestida com o seu melhor vestido
refletia nas gotas, que o enfeitavam, a luz do astro rei.
A
vida é um inexorável caminhar em direção à morte e à vida.
A
Rosa Vermelha, por certo, sabia muito bem disso. Ela própria estava sujeita a
esta lei. Nascer, Viver, Morrer, Renascer.
Não
sabia dizer se a Rosa Vermelha, como ele, acreditava na vida após a morte e na
reencarnação.
Sentiu
um nó na garganta ao lembrar-se que todos aqueles meninos, que estavam
apressando o fim de suas vidas, numa outra encarnação, por certo, haveriam de
passar momentos de extrema delicadeza para saldarem suas dividas pelo crime
contra a lei da vida. Estavam abreviando as suas vidas e no futuro, numa outra
encarnação, teriam que repetir as lições e aprenderem as novas sem as mesmas
facilidades de agora.
A
imagem da Rosa Vermelha se avantajou na sua mente e numa bela mágica falou: se
eles vão sofrer imagine aqueles que tentaram e permitiram que os meninos se
drogassem.
É
mesmo! Todos eles vão ter que pagar tim tim por tim tim as suas más tendências,
convertidas em atos contra as Leis de Deus.
A
Rosa Vermelha, outra vez, avivou-se na mente dele e disse: Lembre-se que a
misericórdia de Deus é muito grande e ele não condena, eternamente, nenhum de seus maus filhos, a todos ele
oferece a oportunidade de redimirem-se, porém, os ventos semeados
inconseqüentemente, serão obrigatoriamente colhidos, às vezes, como vendavais.
Assim, os que contribuem para a perdição destes nossos filhos, vão ter que
lutar com a perdição. Será uma luta, com certeza, com muito sofrimento.
Chegou
ao seu lugar de trabalho, parou o carro, desligou o motor e ficou parado,
olhando através do para-brisa sem nada ver.
A
sua mente encheu-se de imagens. Quantas e quantas vezes tinha visto o menino
caído no meio fio com o saquinho de cola na mão. Será que as outras pessoas não
haviam visto aquela cena. Será que a cidade cujos olhos detalhistas para as
modas e divertimentos não estava vendo a perdição à sua frente. Será que a
grande quantidade de crak apreendida, não estava mostrando à bela cidade que o
seu meio estava sendo sujeitado pelos emissários da desgraça. Resolveu então,
naquilo que acreditava ser a sua melhor contribuição naquele momento, fazer uma
oração:
Senhor. Não quero prolongar-me
nesta oração A Rosa Vermelha viu tudo e me contou e eu peço neste momento que
através da sua misericórdia envie à minha cidade as energias necessárias para
que todos os seus moradores se transformem em guardiães da vida. Onde houver
tentação que eles possam afastá-la com a razão.
A razão do Pai mostrando o
caminho ao filho;
A razão do professor que ensina o
aluno a vencer pelo saber;
A razão dos políticos que devem
lutar por aquilo que é melhor para todos;
A razão da polícia que deve agir
quando todos os outros métodos falham;
A razão da mãe que é o Seu amor
aqui na terra;
A razão de todos que ajudam no
avanço da moralidade humana, independentemente, de credo, raça ou cor.
Senhor, acima de tudo, porém,
peço-Lhe que não nos deixe continuar na omissão.