Com um gesto largo, ela apontou a mão direita em direção à parede, onde estava pendurada a imaginária gaiola.
— Meus filhos coloquem os dedinhos para fora que a vovozinha quer ver se vocês já engordaram.
Joãozinho e Maria, obedientes, colocavam o rabinho do ratinho para fora.
A vovozinha, que não enxergava muito bem, apalpava o rabinho do ratinho e decepcionada, dizia:
— Preciso aumentar a comida, pois desse jeito vocês nunca estarão prontos.
As peripécias dos irmãos, Joãozinho e Maria, terminavam com os dois escapando da gaiola e voltando para casa, prometendo à mãe nunca mais saírem sem avisar.
Esta era uma das muitas estórias que minha mãe contava para uma platéia atenta, de muitos filhos e agregados.
O texto deixava de ser tão importante, pois a interpretação da caboclinha era de espantar qualquer atriz global.
Hoje, longe daqueles momentos divinais, penso como as pessoas, as mais simples, podem, com algum esforço, transformarem-se em participantes de grande utilidade para o desenrolar da vida.
Lembro-me de minha mãe, baixinha, olhos miúdos e redondos, tomando conta de oito filhos e, na medida da necessidade, brava ou terna.
Era uma tarefa árdua. Todos nós éramos como brinquedos, nos quais, todas as manhãs trocavam as pilhas.
Desde o alazão em que se transformava a janela com um travesseiro, até o circo com o seu inefável serviço de alto-falantes; desde o pula carniça até o esconde-esconde; desde nadar nos ribeirões até os banhos de bacias, numa movimentação de cinema mudo, mexendo em tudo, parando nunca.
Impúnhamos, com a nossa inocência e sede de vida, um duro viver à nossa mãe.
Depois da sua morte poucas vezes sonhei com ela. Na medida em que o tempo passa, a sua lembrança me é mais viva e melhorada, pois passei a entender a sua força e sabedoria.
Muitas coisas, mas muitas mesmo, que fez e que passaram sem registros naquele passado, hoje, no presente, são lições de vida.
As poucas vezes que sonhei com ela, foram momentos de rara felicidade.
A sua imagem reflete a tranqüilidade dos espíritos que cumpriram a sua missão enquanto estiveram encarnados na terra.
Na verdade, quando acordo sinto-me mais sábio, pois o simples fato de estar com ela em meus sonhos, como que por encanto, a minha mente abre-se para as lembranças de seus ensinamentos. Isto me faz mais propenso a entender a vida e a compreender que a felicidade está, exatamente, na grandeza dos nossos corações, dentro dos quais, nem a morte física é capaz de tirá-la.
A cabocla era e é “pedra 90”.
quinta-feira, 5 de maio de 2011
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