quarta-feira, 1 de junho de 2011

O casal de Bem-te-vis

O Bem Te Vi caprichava no seu canto empoleirado no fio. Da antena de uma televisão a fêmea respondia-lhe toda arrepiada. O final da tarde quente, quase sufocante, em pleno inverno, foi visitado pelo pé de vento que desarrumou as penas dos dois pássaros.
Do fio um cantava: - Bem-te-vi, Bem-te-vi, Bem-te-vi......viiiiiii!
Da antena outro respondia: Viiiiiii....... Bem-te-vi, Bem-te-vi.
O nosso senhor, caminhando rápido, com as mãos sobre os óculos, para quebrar a incidência do sol que bocejava, de pijama, pronto para ir dormir, resolveu parar para assistir o namoro das 2 aves.
Há quanto tempo, pensou, ele próprio não trocava, com a sua amada, palavras de admiração, de carinho, de amor.
Com o passar dos anos tornou-se prático graças, evidentemente, às experiências que havia acumulado. De tudo entendia um pouco. Bomba atômica, foguetes espaciais, passagens da Bíblia, peças teatrais, filmes, astros e estrelas de cinema, futebol, mergulho, alpinismo, economia, política, etc. Tudo isto lhe custara muitas horas de raciocínio.
O pássaro macho alçou vôo e passou raspando a antena de Tv e a fêmea, como que pegando em sua mão voou junto com ele. O vôo foi brincalhão com subidas e descidas, como se fossem dois protagonistas de uma dessas histórias de amor que a gente vê nas novelas. Tudo mais havia perdido o seu valor para os dois passarinhos que, com certeza, voariam brincando e rindo até encontrar um galho mais simpático para servir-lhes de cenário de mais uma noite de amor.
O nosso senhor sacudiu a cabeça energicamente e deu um sorriso pelo canto da boca. Não foi preciso que o seu pensamento fosse completo para entender que naquele mesmo dia, chegaria e resgataria o tempo que a convivência tratara de tornar sem calor.
Pensou na sua querida mulher e nele próprio, como dois seres com todos os direitos do mundo de rir, chorar, amar, torcer, amar, amar mais, muito mais amar.
Os seus filhos já estavam grandes e embora fossem, ainda, destinatários do amor deles, já recebiam amor de outras pessoas, namoradas, amigos, colegas, e eles, a menos que materializassem o amor de um para o outro, perderiam o jeito carinhoso de se expressarem.
Por isso, entrou pela porta da cozinha, com o olhar marotamente colocado na posição de desejo e sem dizer nenhuma palavra, apanhou pelas mãos sua mulher e como dois Bem-te-vis, saíram procurando um canto que hes pudesse servir de cenário para uma noite de amor.
Dali pra frente, a brasa desta noite de amor, se fosse avivada todos os dias, jamais se apagaria e ele jamais precisaria ficar com inveja de um casal de Bem-te-vis.


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