O seu casaco
azul de gola em “V” de se colocar pela cabeça, aquecia o seu corpo com sobras e
o frio que todos esperavam não chegava a incomodá-lo.
Enquanto subia
pela Rua 7 de setembro ia prestando atenção nas pessoas apressadas, saltitantes
e de olhares desconfiados que passavam por ele.
Tempos atrás não
era assim. Sair de casa naquele tempo era ganhar uma sucessão infindável de
bons dias e de sorrisos amigos e de algumas conversas esclarecedoras. Hoje, o
mundo mudou.
Na esquina da
rua Tiradentes, passou por ele uma mulher grávida, pelo corado das maçãs do seu
rosto, que mais parecia uma lâmpada ligada em alguma tomada do céu, lá ia ela
como que empurrando um carrinho que teimava ficar invisível para as pessoas
comuns. Para ele e para ela, não. Era um
carrinho cheio de felicidades.
As grávidas
desde há muito tempo sempre o encantaram. A felicidade que ele sentia ao ver
uma, era indescritível.
Talvez porque
ele sabia como ninguém que a gravidez representava a existência de uma nova
vida, para começar um novo tempo. Isso mesmo, uma nova vida é sempre o começo
de um novo tempo. À medida que as novas vidas começam, o mundo deixa para
trás o rastro na estrada da ignorância,
pois cada uma delas, traz consigo um pouco mais de sabedoria, não a simples
sabedoria científica, mas a sabedoria total, que soma a ciência com moralidade
para o seu uso. Isso é a evolução incondicional do ser humano.
Os seus
pensamentos terminaram quando estava chegando à esquina com a Rua Júlio
Mesquita. Parou, respirou fundo e olhou demoradamente para a esquina da Praça
Barão de Araras. Viu algumas pessoas em duas ou três rodinhas, sem que pudesse
identificar quem eram. Sabia, no entanto, que ali os assuntos ganhavam
importância. Qual seria o assunto tratado? Seria o Viagra? Seriam as pílulas de
farinha?
O Viagra já
baixara de importância e seguramente as pílulas de farinha haveriam de
conseguir a atenção da maior assembleia popular da cidade.
Virou a esquina
e entrou no prédio do Jornal Opinião. Desenhou o sorriso e entrou pela redação
distribuindo os bons dias. A rodinha que estava discutindo calorosamente
emudeceu, para responder o cumprimento e um dos componentes quase gritou: - Tem
uma ararense que usou o Microvlar e ficou grávida.
Não sabe porque,
mas a adrenalina derramou-se copiosamente e ele ficou alerta. Na sua cabeça a
ararense era aquela grávida que passou por ele na esquina da Tiradentes. Será
que ela vai querer abortar e impedir o nascimento do filhinho. O choque foi
grande, mediante esta possibilidade e, a dor de cabeça deu o primeiro sinal.
Sentou-se,
flertando com o frio computador e resolveu mandar uma mensagem à mulher
grávida:
“- Preste
atenção senhora, olha que o mundo desde quando tomou conhecimento de si mesmo,
tem no homem o seu principal artesão que, nesses milênios todos,
pacientemente, tem construído este
progresso que temos agora. Imagine, sem saber nada, apenas por intuição e
forçado a raciocinar ele já conseguiu tudo isso. Imagine agora, com todo o
conhecimento que ele reuniu até agora, raciocinando, em que beleza deverá
transformar o mundo daqui mais cem anos. Acho que deveremos conseguir andar sem
colocar os pés no chão, visitaremos a lua e outros planetas na velocidade do
pensamento, falaremos uma só língua, teremos governo ordenado e sério, teremos
justiça ao alcance de todos, nem precisaremos de policiais. Ah, ia
esquecendo-me, todos nós teremos um computador, com capacidade de falar, sentir
e fazer os nossos serviços, apenas pelo comando de nossas vozes e,
principalmente, teremos o maior cristalizador de todas as conquistas
científicas, o amor. Seremos todos e seremos um.
Para que isso
aconteça, no entanto, é necessário que não seja cortado o fluxo da vinda de
novas vidas para a terra. “Por isso senhora, eu lhe peço, deixe nascer mais
este emissário de Deus”.
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