No valão que marcava o
limite da cidade das chácaras, depois da última rua, a rua 13 de
maio, com suas
cavernas formadas pelos arbustos, principalmente, as temíveis mamonas, servia
para que todos os meninos que moravam nas cercanias, exercitassem o espírito
explorador que faz parte integrante da personalidade dos homens.
Eram mistérios e mais
mistérios.
O bambuzal oferecia
material de primeira qualidade para as espadas e os bodoques com os quais as
crianças brincavam de mocinhos e bandidos.
Mas, dentre todos os
mistérios, o que mais mecheu com as cabeças daquelas crianças foi a presença
intermitente do Zé Lopes, que fazia daquelas cavernas o lugar para seu
descanso.
Este homem povoou e deu asas, principalmente,
às mentes das crianças, mas, também, dos adultos em torno das décadas de 40/50
do século passado.
Este homem, um,
“ligeira”, um andarilho, era figura que hoje, com melhor capacidade de
observação, poderiamos dizer que bela.
A sua altura era média
para época, cerca de 1,60 m., corpo esguio e de tez queimada pelo sol, encimada
por vasta cabeleira branca.
As suas ameaças de
sorrisos, mostravam uma boca sem dentes, entretanto, apesar de tudo, com
certeza, nos dias de hoje serviria de modelo fotográfico, pois como dissemos a
sua figura era de beleza expressiva.
Nos seus melhores
momentos, isto é, quando não estava sob efeito de bebidas, aceitava conversar e
nestes momentos percebiamos que se tratava de uma pessoa de boa cultura, com
indicações de que estivera embarcado em algum barco singrando mares.
Surpreendentemente,
nestas ocasiões, receitava para as pessoas que lhe perguntavam a respeito de
plantas, remédios para diversas doenças, como era costume naquela época.
Dentre as plantas que
mais receitava era aquela que parecia ser a de sua preferência, a pariparoba,
que ele mesmo colhia e oferecia para a maior parte dos seus “pacientes”:
A pariparoba
(Pothomorphe umbellata) era conhecida pelos povos Tupi por caapeba (kaa peba) ...
(vide figura)
1. pariparoba, planta medicinal
utilizada em chás que serve para aliviar problemas digestivos
relacionados ao estômago, fígado, ...
Problemas estomacais e do figado
Você vai precisar de:
- Um
acolher de sobremesa com folhas de pariparoba picadas
- Uma
xícara de chá de água
Modo de Preparo: Ferva a água e acrescente as folhas
de pariparoba. Deixe abafado por dez minutos e depois coe o chá.
Posologia: Beba duas xícaras do chá de
pariparoba no dia. Uma pela manhã e outra antes do almoço.
Era uma grande figura o Zé Lopes, cuja pronuncia no caipires era Zé Lopi.
Entretanto, devia ter os seus fantasmas que o incomodavam e nessas
ocasiões buscava o remédio na bebida.
Apesar disso nunca se portou de maneira violenta, pelo contrário,
tornava-se um artista de um verdadeiro show.
Sua pele queimada pelo sol ficava nestas ocasiões, brilhantes refulgia
em lampejos provocados pela incidência dos raios solares, seus olhos olhavam o
horizonte e quando alguém se interpunha entre ele e o horizonte, ele olhava
através do corpo da pessoa como se não existisse nada à sua frente.
Mas, o ápice do espetáculo era quando, colocando a mâo sobre a boca,
abrindo e fechando os 3 últimos dedos, gritava a pleno pulmões:
- Aaaaaaaaa vida do marinheiro... aaaaaaa vida do marinheiro... aaaaaaaa
vida do marinheiro...
E repetida interminavelmente o seu grito, com o qual parecia querer
acordar alguma divindade que pudesse socorrê-lo, para salvá-lo das mãos dos
seus fantasmas.
É uma pena não ter uma foto do Zé Lopes para ilustrar esta homenagem,
pois ele como poucos foi figura impar e, hoje, após tantos anos, nestas linhas,
pretensiosamente, fica a história de nossa cidade e de seus personagens um pouco
mais enriquecida.
Que onde se encontre receba de todos os meninos que ele encantou o muito
obrigado e as bençãos que ele merece.
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