Há horas ele andava sem
rumo. Já tinha passado pelo bar do Calçadão uma porção de vezes, na
esperança de encontrar um amigo para um bate papo.
esperança de encontrar um amigo para um bate papo.
Já estava pronto para voltar
para casa e ficar ao alcance de sua esposa quando, dobrou a esquina, com uma
cesta coberta por um pano branco no braço esquerdo, o Zé Gostoso. Vinha
sorrindo como sempre.
- Ô Zé, que que tem hoje?
Banana ou laranja?
Sem modificar o sorriso
que o tornava, ainda mais bonito, o Zé Gostoso respondeu, impostando a voz de
vendedor para que todos que estivessem na redondeza escutassem.
- Laranja amarelinha e
doce que cura dor de dentes na hora. Laranja mel, laranja do céu.
Ao ouvir a voz bonita do
Zé Gostoso vendendo o sua laranja, ele notou alguma coisa diferente na “letra”.
- Ô Zé, ô Zé - foi
chamando a atenção da figura interessante e rica que, no entanto, sem lhe dar
atenção continuou a usar o vozeirão para anunciar o seu produto:
- Laranja amarelinha e doce
que cura dor de dentes na hora. Laranja mel, laranja do céu.
A impressão que ele teve é
que o Zé Gostoso nem notou a sua presença, apesar de ter-lhe feito uma pergunta
direta.
O Zé Gostoso virou a
esquina e saiu do campo visual dele. Sentou-se num dos bancos e de mão
segurando o queixo começou a pensar.
º º º Engraçado, o Zé
Gostoso nem me deu pelota. Agora é que estou percebendo aquele olhar dele que
parecia enxergar longe. Era porque
estava olhando através de mim, como se eu não estivesse ali na sua frente,
engraçado.
Ficou dando tratos aos
seus pensamentos e não notou que, o esbranquiçado do ar, dava ao Calçadão um
aspecto de paz. Olhou para os bancos procurando os seus amigos que
costumeiramente estão por ali sentados olhando as modas e não viu ninguém e se
deu conta que apenas ele e mais ninguém estava lá no calçadão. Bem, o Zé
Gostoso era alguém e ele passara por ali. Estava olhando para o lado da praça
quando ouviu novamente a voz forte do Zé Gostoso que, dobrou a esquina da Júlio
Mesquita e veio andando em sua direção.
- Laranja amarelinha e
doce que cura dor de dentes na hora. Laranja mel, laranja do céu.
Deu um salto pondo-se de
pé e, desta vez, disposto a parar a figura ímpar para conversar com ela.
Colocou-se à frente do vendedor de laranjas e este passou por dentro dele sem
sequer perceber a sua presença. As suas pernas tremeram e ele pensou o pior: º
º º Tô morto!
Nisso, por obra de algum
milagre, à sua frente um redemoinho se fez e uma imagem de dentro dele
falou-lhe:
- Meu amigo. Quantas e
quantas vezes esta alma pura, vendendo laranjas passou por você sem que se
dignasse a lançar um olhar, mesmo de curiosidade em sua direção. Esta alma pura
andou por todos os cantos desta cidade, dando exemplos de humildade e de
participação, não rejeitando nunca o trabalho que destinavam a ela. O seu bate
papo era de um homem sem cultura, mas de um espírito de muita luz. Sempre
tinha, para todos um sorriso, um gesto, uma gentileza. Assim é a vida meu
amigo, Deus coloca ao alcance de todos a sua brandura, muitas vezes
representada pelas almas boas como a do Zé Gostoso e nós de cima de nossa
pretensa sabedoria, deixamos de olhar. Passa o tempo e quando olhamos para
trás, vemos as belezas que deixamos de desfrutar porque não paramos para
levantar os olhos para prestar atenção nos nossos companheiros de viagem sobre
a terra.
- Laranja amarelinha e
doce que cura dor de dentes na hora. Laranja mel, laranja do céu.
- Zé Gostoso, Zé Gostoso!
- Agora eu estou vendo o
senhor, em que posso ser útil?
- Por favor, deixe-me dar
um abraço e agradecer-lhe pela grande lição. Muito obrigado. De agora em diante
vou dar mais atenção a todos.
- Isto mesmo senhor, agora
sim o senhor merece saborear uma laranja do céu.
O senhor acordou e sentiu
na sua boca o gosto de uma laranja como nunca tinha experimentado igual, doce
como o mel, uma laranja do Céu.
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